AESA visita o Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz

No passado mês de janeiro, os alunos do 12º ano de Psicologia e Direito realizaram uma visita de estudo ao EPPC, que tem, neste momento, cerca de 600 reclusos. A articulação entre a Diretora do EPPC, Dra. Paula Martins, e a professora Helena Marques do AESA foi fundamental para a organização e planificação das atividades. A visita teve dois objetivos: por um lado, dar a conhecer os serviços existentes, num estabelecimento prisional, e as práticas diárias dos profissionais aí envolvidos; por outro, observar in loco a diversidade de opções de intervenção para o futuro advogado, psicólogo ou técnicos associados aos serviços prisionais, possibilitando aos alunos o contacto com uma realidade muitas vezes fechada ao exterior.

Os 33 alunos fizeram-se acompanhar das professoras Helena Marques e Luísa Diniz. A visita iniciou-se pontualmente às 9:30, com a passagem de todos os intervenientes pelo controlo de segurança do EPPC. Este compreende cerca de 1600 hectares e atividades como a agricultura e a floresta são ali desenvolvidas, tendo o vinho produzido pelos reclusos sido reconhecido pela sua alta qualidade.

Foi-nos possível conhecer vários espaços onde os reclusos trabalham: padaria, oficinas, lavandaria, tratamento de cães abandonados e outros. Percorremos os pavilhões onde se situam as escolas, os serviços clínicos (psicologia, psiquiatria e enfermaria) e o pátio central onde se localiza a igreja; percorremos, de igual modo,  um corredor que nos deu acesso às celas disciplinares e até aí pudemos questionar um recluso que ocupava uma dessas celas. Numa sala de visitas, ouvimos depoimentos de vários reclusos que quiseram partilhar connosco as suas histórias de vida, tentando reconstruir o caminho que os levou à criminalidade – presos por crimes distintos, como tráfico de droga, homicídio, violência doméstica ou roubo.

Depoimentos de dois reclusos do EPPC

Dois dos reclusos preferiram escrever e entregar-nos os seus depoimentos por escrito. É desses escritos que extraímos os seguintes excertos:

«Sou o recluso X, venho de uma família pobre e comecei a ROUBAR roupa e ténis para ser como os meus “amigos”. Depois vieram as coisas mais graves: VENDER DROGA, CONSUMIR, ROUBAR, sempre para ser bem visto perante os outros. EU TINHA MUITOS SONHOS, COMO TODOS TEMOS SONHOS QUANDO JOVENS. Fui perdendo tudo, pois a cadeia faz perder tudo. Depois, veio a minha FILHA e eu queria ser um exemplo para ela, mas não pude dar-lhe o que ela merecia.  E, então, mesmo na cadeia fui-lhe mostrando que a DROGA NÃO presta. Hoje ela não fuma, nem tabaco nem droga e sinto que esta foi a minha VITÓRIA. Hoje, o meu SONHO é sair da cadeia e da vida do crime, pois o Crime não compensa.»

«Olá! Eu sou o recluso Y, tenho 37 anos e estou condenado a uma pena de 25 anos e 6 meses de cadeia por homicídio e três sequestros. Noites de copos, drogas e más companhias. Não tive a noção de como aquela noite ia mudar a minha vida. Perdi a infância da minha filha e a dos meus sobrinhos, já não estou com eles há muito tempo e tenho muitas saudades da minha família. Hoje também olho para os jovens que por aqui passam e vejo-me a mim, que aqui entrou ainda jovem, que chorou, que levou muitos encontrões, mas que principalmente por ser o recluso Y perdeu todos os sonhos de criança. Quero dar-vos um conselho, não cometam crimes, não venham para a cadeia.»

A esmagadora maioria dos alunos agradeceu a oportunidade de ouvir e aprender a não julgar reclusos, sujeitos ao isolamento, à falta de laços sociais afetivos e ao cumprimento das limitações impostas pelo sistema prisional. Depois de almoçarmos nas instalações do EPPC, visitámos o espaço “Regime Aberto”, ou seja, os pavilhões onde vivem reclusos, geralmente aqueles que estão a cumprir o final da sua pena de prisão e onde pudemos constatar um ambiente de maior liberdade e autonomia. Tivemos também oportunidade de ouvir relatos de guardas prisionais e das suas vivências dentro dos muros da prisão.

Finalmente, procedemos à visita às caves onde se produz o famoso vinho de Pinheiro da Cruz, que tem vindo a ganhar lugar no campo dos melhores vinhos portugueses e a ser premiado por várias instituições.

Desde o início até ao fim da visita, o grupo foi sempre acompanhado pela Diretora da prisão, as adjuntas da direção e vários elementos do corpo da guarda prisional. O ambiente em que decorreu a atividade foi de simpatia, respeito mútuo e muita cordialidade.

Resta-nos, por fim, agradecer toda a disponibilidade dos reclusos, guardas, técnicos, direção e todo o pessoal que tornou possível esta excelente iniciativa que ficará seguramente nas nossas memórias.

Professora Helena Marques, ESPAM-AESA.

[Fotografia: alunos, professores da ESPAM e técnicos do EPPC]

Jovializar Março – Jornal “O Leme” 827

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