Tendo em conta as eleições presidenciais, que tiveram lugar no dia 24 de janeiro, e constatando a elevadíssima taxa de abstenção verificada (cerca de 60,5%), parece-me da mais elementar pertinência refletir sobre a importância de votar.
Ir às urnas, mais do que um direito constitucionalmente garantido, é um dever cívico. Quem, no momento certo, o exerce, está, ainda que de modo involuntário, a honrar, justa e merecidamente, a memória de todos aqueles, homens e mulheres, que, à custa de porfiados esforços, não sem coragem e sacrifício, lutaram pelo sufrágio universal, até há bem pouco tempo, e durante largas décadas, reservado a um grupo restrito de indivíduos.
Princípio-chave da democracia liberal (a meu ver, perigosamente fragilizada), o direito de voto impõe-se necessário. Não só coloca num mesmo patamar todos os cidadãos maiores de 18 anos, assim mitigando desigualdades, como confere aos governados o poder diamantino de, mediante as suas crenças político-ideológicas, escolherem os seus representantes e, através destes, as medidas e as propostas que, levando em consideração as suas reais necessidades, e os problemas do país e do mundo, julgam mais eficazes. Votar é uma forma pacífica de protesto. Uma arma sem munições. Como justamente sublinhou Abraham Lincoln, “Um boletim de voto tem mais força que um tiro de espingarda”.
Votar é importante. Agora, fazê-lo em consciência, com propriedade e de modo esclarecido, também. Para tanto, insta pôr cobro à despolitização a que, nos termos mais claros possíveis, se tem vindo a assistir, apresentando como causas imediatas: por um lado, a ideia de que apenas uma franja minoritária da população, tendencialmente mais escolarizada, se encontra apta a debater e discutir questões de cariz político, e, por outro, a noção de que nas cúpulas governativas, onde têm assento os nossos legítimos representantes, apenas prevalecem a corrupção, a hipocrisia e o oportunismo. Cabe a cada um de nós evitar que apreciações como estas, incutidas nos adolescentes como se de fatalidades inelutáveis se tratassem, persistam. Acredito, e digo-o convictamente, que, ao diminuir, por meio de um esforço sério e continuado, o fosso entre as pessoas e a política (relegada para um plano quase de serva), a nossa sociedade dificilmente embarcará em cantigas salvíficas, narrativas veladas e discursos autoritários e/ou populistas. Derrubar obstáculos, transpor barreiras, ora privilegiando o bem comum, ora lutando por um sistema governativo democrático, deve constituir, numa época em que nada permanece inalterado, uma preocupação fundamental.
Uma vez identificado o busílis da questão, urge atacar as raízes do problema, introduzindo mudanças no ensino. Apostar, como em tempos foi costume, numa disciplina (de frequência obrigatória) que, tanto quanto possível de forma isenta, propicie um maior contacto entre os jovens e a política, dando-lhes a conhecer, sem o fardo das convicções pessoais, a estrutura orgânica do aparelho estatal, assim como os programas de cada um dos diferentes partidos do espetro político português, afigura-se-me um bom ponto de partida. Não menos importante, a promoção reiterada de debates informados e plurais em torno de matérias de interesse nacional, como as alterações climáticas, a eutanásia e, entre outras, a igualdade de género.
Torna-se impreterível, tendo em vista a criação de uma sociedade politicamente mais ativa e consciente, dotar as gerações mais novas de amplos conhecimentos políticos – responsabilidade que, como já aqui foi dito, impende sobre todos nós, desempenhando a escola, e antes a família, um papel não despiciendo.
Por Hugo Alexandre Martins